segunda-feira, 25 de julho de 2011

A revolução doce da educação

Recentemente o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) virou notícia ao apresentar a PEC 19/10, uma Proposta de Emenda à Constituição alterando seu artigo 6o, que passaria a incluir o direito à busca da felicidade por cada indivíduo e pela sociedade, numa referência óbvia à declaração da independência dos Estados Unidos. A proposta ficou conhecida como a PEC da felicidade. A tolice por trás da idéia ridícula do senador é imaginar que tudo possa se resolver à base da canetada, inclusive o direito à busca da felicidade; como se todos os nossos problemas fossem ser magicamente resolvidos no momento seguinte à aprovação da proposta no senado.


Ainda assim, todos poderíamos dormir tranqüilos, e felizes, caso sua única preocupação fosse garantir na Constituição o nosso direito pela busca da felicidade. No entanto, o ímpeto populista do senador cisma em aflorar na forma de projetos de lei os mais estapafúrdios, como o PL 480/2007. Trata-se de um projeto de lei enviado ao senado pouco após as eleições presidenciais de 2006, quando Cristovam Buarque ficou em 4o lugar e recebeu 2,6% dos votos válidos com uma campanha ancorada no slogan sem qualquer significado prático da “revolução doce da educação”.

Visto que aparentemente não foi capaz de promover sua doce revolução como Ministro da Educação no governo Lula, entre 2003 e 2004, decidiu iniciá-la como convém às revoluções: de forma autoritária e com claro viés demagógico, apresentando este projeto de lei que prevê que todos os agentes públicos eleitos para os Poderes Executivo e Legislativo federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal sejam obrigados a matricular seus filhos e demais dependentes em escolas públicas de educação básica.

Conforme previsto, o projeto alcançou larga aceitação popular, contando inclusive com manifestações organizadas nas redes sociais. Muitos se uniram à favor do projeto de lei, cheios de boa intenção, imaginando de forma simplista que, ao sentir na pele os efeitos perversos da educação pública de péssima qualidade, os políticos correriam em busca das soluções adequadas para resolver este terrível problema. Porém, não custa muito perceber que este é o tipo de solução que se encaixa perfeitamente na máxima de George Bernard Shaw, de que para todo problema complexo, existe uma solução clara, simples e errada.

Existe no meio político brasileiro a forte noção de que qualquer tipo de problema pode ser resolvido à base da canetada autoritária, como no folclórico caso de Biritiba-Mirim, SP, onde o prefeito tentou proibir a população de morrer, por conta da falta de vagas no cemitério na cidade. O projeto do senador pode não chegar neste nível de ridículo, mas flerta perigosamente com o pensamento fascista ao tentar restringir a liberdade de escolha de determinado grupo de pessoas, tratando de forma discriminatória parte da população. Além disso, o projeto de lei mostra-se claramente inconstitucional, ao bater de frente com o artigo 5o da Constituição, que declara que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Também parece confrontar-se com o art. 209o, que determina que o ensino é livre à iniciativa privada.

Felizmente, o projeto de lei ainda está sendo avaliado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, presidida pelo senador Demóstenes Torres, DEM-GO, de onde dificilmente será aprovado para votação, ao menos na forma como se encontra.

Também não deixa ter certa graça que o remédio proposto pelo senador Cristovam Buarque não sirva para ele próprio, visto que suas duas filhas estudaram a vida toda em escola particular. Como se diz no interior, é fácil pedir esmolas com o chapéu dos outros.

Ao invés dessas ações populistas, visando unicamente mais alguns votos para a próxima eleição, o senador deveria preocupar-se em atacar o problema da forma correta: com valorização e capacitação do professor, implantação da meritocracia em toda a rede de ensino, profissionalização da gestão dos diretores de escolas, mais eficiência no gasto das verbas públicas, material didático de boa qualidade, entre outros. Mas todas essas coisas levam tempo, exigem dedicação, muito esforço e rendem menos votos que sair por aí com medidas populistas, inexeqüíveis e inconstitucionais. Nunca um país avançou atropelando sua carta magna. Pelo contrário, este é o atalho mais rápido para solapar a Democracia e o Estado de Direito, nossa maior conquista como civilização.

2 comentários:

  1. humilde comentário..."existe uma solução clara, simples e errada" bom de se lembrar sempre.
    Divertido também =)

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  2. como jurista fico com vergonha de ler essas coisas viu... a que ponto chegamos

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