domingo, 20 de maio de 2012

Festival de Cannes 2012 - Resumo dos Quatro Primeiros Dias


"Declaramos aberto o 65ª Festival de Cannes", declarou Anderson, acompanhado dos atores Edward Norton, Bruce Willis, Bill Murray, Tilda Swinton e Jason Schwartzman, além das crianças Kara Hayward e Jared Gilman, atores de "Moonrise Kingdom", um filme lúdico e melancólico que estreou no festival. A franco-argentina Berenice Bejo tinha dado antes as boas-vindas aos 3.000 convidados para a cerimônia de abertura do maior Festival de cinema do mundo, que reunirá durante 12 dias a realeza de Hollywood e gigantes e jovens talentos do cinema.

Vestida de vermelho, Bejo, designada mestre de cerimônias do Festival de Cannes - que no ano passado a recebeu como a desconhecida intérprete do filme mudo em preto e branco "O Artista", que começou ali uma carreira de triunfos mundiais - apresentou os membros do júri, presidido pelo cineasta italiano Nanni Moretti.Moretti, que foi recebido com aplausos de pé, destacou a atitude da França, que soube manter um cinema nacional quando outros países desprestigiaram as produções locais, entre eles a Itália, seu próprio país."Obrigado a este país que, diferentemente de outros, continua sempre reservando um lugar ao cinema", disse o presidente do júri, que conquistou a Palma de Ouro em Cannes em 2001 por "O quarto do filho"."É para mim uma grande honra, um grande privilégio, uma grande responsabilidade, ser presidente do júri do festival de cinema mais importante do mundo", acrescentou.  (Agência Estado).

16 de Maio

Moonrise Kingdom

É raro, nos dias atuais, um diretor ter um perfil claramente definido em seus filmes, ao ponto do espectador ser capaz de identificar de imediato sua assinatura. Woody Allen é um deles, mas vem de uma geração que começou a rodar seus primeiros longas ainda na década de 60. Entre os contemporâneos, Wes Anderson é um dos poucos casos existentes. Adepto de um estilo de comédia irônico, que aposta no desencontro de sentimentos em famílias desconexas, Anderson sempre impõe seu estilo em qualquer trabalho em que se envolva, mesmo quando é a adaptação de um simples livro infantil, como é o caso de O Fantástico Sr. Raposo.

Com Moonrise Kingdom não é diferente. Trata-se, mais uma vez, de um típico filme do diretor. Moonrise Kingdom’ é encantador, ocasionalmente comovente e por vezes perturbador, mas sempre atraente, como um filme de Wes Anderson deve ser. O realizador faz um esforço notório para nos mostrar que este é um filme seu, que ao início pode parecer demasiado espalhafatoso e óbvio, onde o estilo se sobrepõe ao contéudo. Mas uma coisa é certa, este é um filme nostálgico e apaixonado, sobre uma época onde não existiam celulares ou jogos de vídeo. É impulsivo e divertido, de uma maneira que só Wes Anderson consegue, mas não se consegue destacar das restantes obras da sua filmografia. Apesar de ser divertido (uma palavra que me surge sempre no pensamento) não me surpreendeu assim tanto.

Contado em apenas 90 minutos, ‘Moonrise Kingdom’ não é nenhum épico, mas mais uma história de amor contida. Dado o número de personagens envolvido, é incrível como Anderson nos consegue fazer sentir como se os conhecêssemos antes, apesar de por vezes eles surgirem por apenas alguns minutos. [...] ’Moonrise Kingdom’ pode agora ser considerado como o terceiro membro de experiências contidas e pessoais do realizador, juntamente com ‘The Life Aquatic with Steve Zissou’ e ‘Fantastic Mr. Fox’. (Agradecimentos a Rope of Silicon e Awards Daily, pela resenha).

‘Moonrise Kingdom’, como todos os filmes de Anderson, é muito bonito e divertido nesta abordagem da dor e da tristeza. O filme brilha, mas brilha no escuro, como uma luz suave e amena, mantendo o frio e a noite do mundo afastados, tornando este filme de Wes Anderson em algo muito especial.






17 de Maio 

‘DE ROUILLE ET D’OS’

Começa no Norte. Ali encontra-se com Sam, 5 anos, nos braços. É filho dele, mal o conhece. Sem domicílio, sem dinheiro e sem amigos, Ali encontra refúgio em casa da irmã em Antibes. Ali, fica logo tudo melhor, ela aloja-os na garagem do seu pavilhão, trata do pequeno e está bom tempo. Após uma luta numa discoteca, o seu destino cruza o de Stéphanie. Ela leva-o para casa e deixa-lhe o número de telefone. Ele é pobre; ela é bonita e muito segura. É uma princesa. Tudo os opõe. Stéphanie é treinadora de orcas no Marineland. Será necessário que o espetáculo se transforme num drama para que um telefonema noturno os volte a reunir. Quando Ali a encontra, a princesa está numa cadeira de rodas: perdeu as pernas e muitas ilusões. Ele vai simplesmente ajudá-la, sem compaixão, sem piedade. Ela vai voltar a viver.

É um magistral trabalho onde o realizador consegue transmitir o seu imenso talento através de duas esferas com alquimias muito complexas, tudo isto suportado por dois excelentes atores, que encontram a luz no coração das trevas. O que fazemos para sobreviver? Quem amamos? Com quem lutamos? Quais são as forças visiveis ou invisíveis que nos empurram em direções inesperadas? Estas são as questões que Jacques Audiard aborda em ‘De Rouille et D’os’, uma bela e comovente história de duas vidas fraturadas que de algum modo se completam, mesmo que seja de formas não convencionais.

‘De Rouille et D’os’ flui de uma forma interessante, com intensidade e drama. Apesar de parecer algo longo, isso não quer dizer que seja menos espantoso por isso. Não digo que chegue ao patamar de ‘Un Prophete’, mas consegue ficar bem perto, demonstrando a mesma paixão. Tanto Schoenaerts como Cotillard têm interpretações espantosas.

MYSTERY’

Lu Jie está longe de imaginar que o marido Yongzhao tem uma vida dupla, até ao dia em que o vê entrar num hotel com uma mulher nova. A vida de Lu Jie entra então em colapso, e isto é só o início… A mulher morre atropelada por um carro pouco tempo depois. O polícia encarregado do caso recusa-se a acreditar num acidente…

Lou Ye regressa num filme que é tudo menos um compromisso artístico ou temático. Este é um retrato sombrio sobre corrupção, sexualidade promíscua e a imoralidade da sociedade contemporânea chinesa. Apesar da história central se inclinar mais para o melodrama, a mistura confiante entre o realismo e a poesia consegue manter ‘Mystery’ no bom caminho. Mystery’ explora noções de fidelidade, família e identidade, bem como a atração sexual. Um retrato da sociedade chinesa, que é corrupta e interesseira, mas mesmo assim com ilustres exceções. Os jovens ricos, que são literalmente capazes de fugir a um assassinato, são só uma parte desse sistema que, com o evoluir da riqueza da nação, parece ter perdido o rumo moral. (Agradecimento ao pessoal do Cine-Vue, pela crítica!)

18 de Maio 

‘REALITY’

Luciano é um pescador napolitano, que retira pequenas escamas com a sua mulher Maria, como suplemente ao seu modesto ordenado. Luciano é uma pessoa agradável e divertida, e nunca perde a oportunidade de atuar para os seus clientes e familiares. Um dia a sua família convence-o a concorrer ao Big Brother. Na perseguição do seu sonho, a sua percepção da realidade começa a mudar.

Em ‘Reality’, de Matteo Garrone, prevalecem decisões inteligentes, e muitos pequenos momentos provam ser brilhantes após alguma reflexão. A justaposição de Garrone brilha, sendo uma das melhores qualidades deste filme. Existem imensos momentos de surpresa, que decerto irão impressionar qualquer estudante de cinema. Mas no fim, é este mundo rico e fascinante que Garrone criou através destas personagens que fazem com que ‘Reality’ seja uma experiência única.

‘BEASTS OF THE SOUTHERN WILD’

Hushpuppy, de 6 anos, vive no pântano com o pai. De repente, a natureza altera-se, a temperatura sobe, os glaciares derretem, libertando uma multidão de auroques (espécie de boi selvagem). Com a subida das águas, a irrupção dos auroques e a saúde do pai debilitada, Hushpuppy decide ir à procura da mãe desaparecida.

Numa terra a sul de Louisiana, Hushpuppy de 6 anos vive de acordo com um simples código: “Quando somos pequenos, temos que arranjar o que podemos.” É um mantra que se aplica em ‘Beasts of the Southern Wild’ de Benh Zeitlin, uma estonteante estréia que vê a sua heroína principal a lutar contra ondas gigantes e criaturas fantásticas numa batalha mítica contra a modernidade. Este filme de estréia de Zeitlin consegue ser desafiante, inovador e intensamente comovente, sem nunca ser piegas. [...] ‘Beasts of the Southern Wild’ é facilmente um dos filmes americanos mais emocionantes dos últimos anos. (Agradecimentos, novamente ao pessoal da Cine-Vue).

19 de Maio 

No dia 19 de Maio, quarto dia do Festival de Cannes, foi exibido o novo filme de John Hillcoat, que anteriormente nos trouxe ‘A Estrada’ ‘Escolha Mortal’, um épico de gangsters sobre a altura da proibição. Existia também uma grande expectativa para o primeiro filme de Brandon Cronenberg, ‘Antiviral’, que marca a estreia do filho de David Cronenberg nas longas-metragens.

‘LAWLESS’

1931. No coração da América em plena proibição, no condado de Franklin na Virgínia, estado célebre pela produção de álcool de contrabando, os três irmãos Bondurant são traficantes notórios: Jack, o mais novo, ambicioso e impulsivo, quer transformar o pequeno negócio familiar em tráfico de envergadura. Sonha com roupas bonitas, com armas e espera impressionar a sublime Bertha… Howard, o do meio, é o brigão da família. Leal, o seu bom senso dissolve-se regularmente no álcool que não consegue recusar… Forrest, o mais velho, é o chefe e continua determinado a proteger a família das novas regras impostas por um novo mundo econômico. Quando Maggie chega a Chicago, fugitiva, ele toma-a igualmente sob a sua proteção. Sozinhos contra uma polícia corrupta, uma justiça arbitrária e gangsters rivais, os três irmãos escrevem a respectiva lenda: uma luta para permanecerem no seu próprio caminho, durante a primeira grande corrida ao ouro do crime.

Existem alguns confrontos, alguns momentos incríveis de violência, muito sangue como todos esperavam, linguagem rude, e mais. O realizador John Hillcoat filma sempre de forma bela, com uma cinematografia subtil, e deixa as personagens tomarem as rédeas desta história de época. A história em si é um pouco mais do mesmo, não gerando muitas surpresas, mas é um excelente filme de entretenimento sobre gangsters na época da proibição.

'ANTIVIRAL'

Syd March é um funcionário de uma clínica que se especializa na venda e injeção de vírus cultivados sobre a pele de celebridades a fãs obcecados. Uma comunhão biológica, por um determinado preço. Syd vende também ilegalmente amostras destes vírus a grupos de criminosos roubando-os à clínica para a qual trabalha depois de os ter introduzido no seu próprio corpo. Quando fica infectado pelo vírus que provocou a morte da super celebridade Hannah Geist, Syd torna-se num alvo para os colecionadores e os fãs em delírio. Tem então de elucidar o mistério à volta desta morte antes de ter o mesmo fim trágico.

Como sátira da cultura moderna, ‘Antiviral’ de Brandon Cronenberg é um sucesso, com uma realização precisa e convicta. De qualquer forma, por estas razões, é também frio, estéril e completamente vazio de humanidade e sentimento. É possível que estas características sejam consideradas como pontos a favor, visto que fazem parte das intenções de Cronenberg, mas isso não significa que todas as pessoas vão gostar deste filme.  As interpretações e os diálogos reforçam esta frieza, com personagens que só se libertam dos murmúrios monossilábicos quando estão em extremo sofrimento ou quando pretendem fazer algum comentário sobre a sociedade.

As idéias são imaginativas e por vezes inteligentes, mas nunca extraordinárias, como os melhores trabalhos no gênero. Uma estréia forte, onde sentimos que o realizador conseguiu obter exatamente aquilo que procurava. Apesar de demorar um pouco a desenrolar, e apesar de ter diversas falhas que muitos primeiros filmes têm, este primeiro filme de Brandon revela-nos uma tremenda promessa. A segunda parte é onde ‘Antiviral’ realmente mostra os seus dentes, com uma narrativa única que chega a locais fascinantes e sombrios.

No próximo post, mais análises das amostras do festival de Cannes 2012.
Até lá!

Nenhum comentário:

Postar um comentário