"Nunca mais tive amigos iguais
aos que tinha aos doze anos. Jesus, será que alguém tem?"
Ha vinte e seis anos era lançado nos
cinemas, sob a direção de um então novato Rob Reiner ( também diretor de Harry e Sally, Fantasmas do Mississippi e
Antes de Partir) o filme Stand By Me, com roteiro adaptado do conto "O
Corpo", retirado do livro "As Quatro Estações" do escritor
Stephen King, cuja história é também a sua obra mais pessoal: tudo remete
claramente a uma fase de sua vida; seu irmão morto em um acidente de carro, o
fato de o personagem principal ser um escritor famoso quando velho e diversas
outras metalinguagens pessoais.
O filme conta a estória de Gordie
Lachance (Richard Dreyfuss – Will Wheaton), um escritor, que recorda quando
tinha entre doze e treze anos no verão de 1959, quando vivia em Castle Rock,
Oregon, uma localidade com 1281 habitantes que para ele era o mundo inteiro.
Gordie tinha três amigos inseparáveis: Chris Chambers (River Phoenix), Teddy
Duchamp (Corey Feldman) e Vern Tessio (Jerry O'Connell). Chris era o líder
natural deste pequeno grupo, mas a família dele não era boa e todo mundo sabia
que ele ia se dar mal na vida, inclusive ele. Teddy era emocionalmente
perturbado, pois o pai tinha acessos de loucura, inclusive chegou a colocar a
orelha de Ted no forno. Vern era o mais infantil do grupo, quem os outros
adoravam tirar sarro. Tentando achar um vidro cheio de moedas que tinha
enterrado, Vern ouviu por acaso seu irmão e um amigo falando onde estava o
corpo de um garoto – Ray Brower - que tinha ido colher amoras há três dias e
nunca mais tinha sido visto. Os garotos queriam achar o corpo, pois
vislumbravam a possibilidade de se tornarem heróis. Cada um deu uma desculpa em
casa e partiram para tentar encontrar o corpo. Nenhum deles tinha idéia que
esta viagem se transformaria em uma jornada de autodescoberta que os marcaria
para sempre.
O filme é uma grande jornada de aprendizado, mas a ênfase fica na aventura - a aventura
da amizade sobretudo- e em tudo o que para esses jovens é descoberta do mundo.
Com um roteiro simples, dialogos articulados e cenas muito bem trabalhadas e
produzidas o filme consegue transmitir todas as principais lições de vida do
livro de Stephen King. Uma das provas disso é que o filme se passa em 1959, mas sua
mensagem pode ser captada por qualquer um que tenha tido uma boa infância e
sabe da saudade que bate de cada coisa que fizemos nessa fase tão especial de
nossas vidas.
Rob Reiner consegue ir além de colocar o telespectador como
mero observador: Involutaria e naturalmente, ao longo dos acontecimentos,
questionamos diversos pontos de nossas vidas através do olhar ingênuo e sincero dos personagens, e, de
maneira autentica e poética, submergimos numa fantasia
aparentemente comum, mas que marcou como uma enorme aventura cheia de ação e
suspense num mundo que fazia total sentido para nós. E mesmo sendo um drama com
uma melancolia dedilhada, o
filme se mantém em uma linha tênue de sensibilidade, onde os personagens
caminham cuidadosamente dentro do perfil traçado originalmente pelo escritor e
ao mesmo tempo, conseguem desenvolver-se com muita liberdade na caracterização
do personagem de maneira visual.
O filme consegue ser tocante no ponto
certo desde a sua cena inicial, quando Gordie, agora adulto, lê em seu carro a
notícia sobre a morte do “famoso advogado” Chris Chambers, seu grande amigo de
infância, e se emociona ao ver dois garotos andando de bicicleta, fazendo com
que todas às suas lembranças da juventude voltem à sua cabeça em um fluxo de
consciência. Isso não acontece conosco? Ás vezes nossas vidas andam tão cheias,
que esquecemos o quanto é bom relembrarmos os bons momentos de nossas vidas.
Dentro desse ponto, somos atirados à
memória de Gordie em sua conturbada infância. Mesmo com a falta de perspectivas
quase que geral em relação à Gordie e seus amigos, juntos, eles eram felizes
como adulto nenhum é. O filme mostra com eficiência o quanto é pura a amizade
entre os jovens, marcada por inocência e sinceridade, que todos sabem que um
dia irão se extinguir. Da mesma forma que as amizades de infância ficam
marcadas, mas são muito difíceis de serem cultivadas até a idade adulta.
Gordie, Chris, Teddy e Vern, mesmo com personalidades completamente diferentes,
eles eram almas que se completavam. As interpretações, distintas e complexas,
se mostram incrivelmente coesas dentro da história, cativando o observador. È impossível não se
identificar com pelo menos um dos quatro garotos do filme, que por sinal, são
interpretados com maestria pelos jovens astros. A química demonstrada entre
eles é tão verdadeira, que parece que eles realmente são amigos de longa data.
A aventura de ir em busca de um corpo
não encontrado pela polícia e a possibilidade de encontrá-lo e se tornarem
heróis, é a representação dos sonhos de qualquer jovem de querer aparecer, de
poder tudo. Algo semelhante a um aluno com fama de burro responder a uma
pergunta difícil na sala de aula, em frente a todos. O jovem sente a
necessidade de viver com emoção cada momento da vida, antes que seja tarde
demais. Agindo da forma que lhes convém e achando que assim adquirem
superioridade e independência, sentem todo o poder ao invadir um local proibido
ou simplesmente fumar um cigarro.
O filme mostra com delicadeza todas essas
sensações de ser jovem. Há
um ponto interessante a ser aprendido, de ressaltar o espírito de ser
criança que pode ser uma importantíssima lição para os jovens precoces de hoje,
quando um dos personagens faz uma linda menção ao fato de ser criança, já que
ele “vai viver apenas uma vez essa fase em sua vida”. E é isso mesmo, fazer
coisas simples, com pouco dinheiro,
mas que rendam milhares e milhares de histórias e saudades no futuro. Um dos
grandes trunfos do filme é nos fazer sentir saudade de quando éramos crianças,
de quando não tínhamos preocupações e como era gostoso simplesmente descobrir
tudo, exatamente como seus personagens na história.
Contrastando
com esse espírito de ser jovem e aproveitar cada momento dessa fase há a
personificação de uma geração: no começo do filme, somos apresentados aos
personagens enquanto eles fumam, jogam baralho e
falam sobre coisas de gente grande. A pressa em crescer sempre foi uma das
características dos jovens, mas ao traçar esse paralelismo, o filme ganha força
principalmente ao provar a ingenuidade dos garotos no final, quando eles
encontram o corpo (não estou estragando nenhuma surpresa, afinal, uma das
primeiras frases do filme diz que eles realmente encontraram o corpo).
O
diretor e os roteiristas conseguiram imprimir nos personagens dentro da história, a pureza e honestidade necessária para demonstrar que a aventura em busca de um corpo que,
inicialmente, era um caminho para a fama, mostrando-se um caminho complexo,
divertido e emocionate de autoconhecimento e maturidade. Esse é um ponto importantíssimo – não há a esperada consagração dos personagens, mas sim uma violenta sequencia
para a realidade, para a morte, para a sensação de estarmos vivos e
testemunhando a história. É um crescimento forçado pela situação, cru e real. Todos mudam com a
experiência da viagem, principalmente nós, que estamos assistindo-a.
A
mensagem final é tão simples e honesta, tão
verdadeira e atual, que desmonta o espectador: A importância da amizade geralmente
só é encontrada quando essa deixa de existir. E encontrar amizades sinceras,
como as que temos quando jovens, fica cada vez mais difícil. Com uma beleza sui
generis, o filme nos brinda com lindas paisagens e, ao fim, vemos um Gordie –
agora adulto e escritor – lembrando-se com um amor genuíno o verão de 1959 e indagando a si mesmo, depois da
morte de Chambers e do distanciamento natural de Teddy e Vern: "Amigos entram e saem de nossas vidas
como pessoas que entram em um restaurante." E eles simplesmente se vão. A ultima
frase de Gordie nos toca profundamente: "Nunca mais tive amigos iguais
aos que tinha aos doze anos. Jesus, será que alguém tem?" De fato,
encontrar amizades sinceras é algo bastante improvável. Nem toda amizade é
eterna, principalmente as de infância que cicatrizam, mas são difíceis de serem
cultivadas até a fase adulta.
Nenhum filme retratou de forma tão
gostosa como é época em que somos mais jovens, aprendendo a conhecer o mundo e
quanto ver as amizades nessa época são as mais verdadeiras. O fardo que cada um carrega, a esperteza que esconde a inocência e inexperiência, as conversas sobre "assuntos importantes", a vontade de ser alguém no futuro mas de se dar ao luxo de não ser nada mais que um garoto de doze anos. O olhar melancólico, saudosista do narrador sobre aquele período de sua vida é apaixonante. Você se vê envolvido num sentimento alheio, e toma aquilo como seu. São seus amigos, sua saudade. É incrível.
Adoro esse filme! Vi milhões de vezes e sempre é a mesma emoção!
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